Um mês de saudade das vítimas da Boate Kiss

A rua dos Andradas em Santa Maria, se tornou uma espécie de templo


Por Laudir Dutra
CAXIAS DO SUL - Eu me lembro, eu estava bem pertinho de Santa Maria e do palco da tragédia. Eram aproximadamente 8h da manhã do dia 28 de janeiro quando um boletim ao vivo interrompia a transmissão do jogo de futebol de areia e dava a notícia de que uma tragédia de grandes proporções ocorrera na Boate Kiss de Santa Maria.
Pelo silêncio que se fazia no Capejar, camping do clube de caça e pesca da cidade de Jaguari parecia até que teria sido na própria cidade. Não houve quem não tenha sido atingido de alguma maneira.
Inicialmente as notícias davam conta da morte de 70 pessoas e que poderia chegar a 180 no máximo. Mas á medida em que as informações iam sendo atualizadas, os números aumentavam, evidenciando ainda mais o pavor no rosto das pessoas que ali estavam acampadas para curtir o veraneio. Confesso, demorou para cair a ficha.

Pelo menos durante uns quatro dias não se ouviu falar em outra coisa e o verão ficou para sempre marcado comoa época em que centenas de jovens deixaram a vida escapa entre a fumaça e os escombros da Boate Kiss.
Ironicamente o nome do estabelecimento sugeria beijo, mas o que mais se ouviu foram palavras de indignação e lágrimas no semblante de todos, mesmo daqueles que não eram parentes ou amigos. Ninguém ficou indiferente.
Coincidentemente a reportagem passou por lá uma semana depois do ocorrido e podemos constatar e sentir um pouco a dor da cidade. O caminho de volta para Caxias passava necessariamente por Santa Maria e definitivamente isso vai ficar para sempre marcado na nossa trajetória jornalística, como um dos fatos mais chocantes da história.
Hoje, dia 27 de fevereiro, faz exatamente 30 dias desde que tudo se passou e o que se viu até agora foram as drásticas mudanças de comportamento das pessoas e principalmente das autoridades que ainda estão reavaliando suas posturas diante de tragédias desta magnitude. Ficou evidenciado a fragilidade e a falta de critérios para a concessão de alvarás e habite-se, não só em Santa Maria, como também em Caxias do Sul, no Brasil e no mundo. Aqui, muitos estabelecimentos foram interditados e fechados definitivamente.
Agora talvez as coisas possam ser melhor fiscalizadas, leis existem, mas não são cumpridas, mais em função da falta de material humano para acompanhar mais de perto.
As autoridades a partir de agora, podem ficar mais espertas no que tange à segurança, pessoas que vão armadas para dentro de locais públicos, onde menores entram tranquilamente, bebem a noite inteira sem que nada aconteça.
A cultura do consumo e da gastança vai acabar o dia em que as autoridades e os donos de certos locais entenderem que dá para ter lucro fazendo a coisa certa.
É comum observarmos em algumas casas noturnas aqui da cidade, uma lotação muito acima da sua capacidade, sem espaço para dançar, onde as pessoas vão apenas para beber e jamais para se divertirem.
Geralmente a imprensa tem dificultada a sua entrada com equipamentos de áudio e vídeo, esses certamente têm receio de que alguma coisa possa chegar às autoridades.
Nos próprios estádios de futebol a venda de bebidas alcoólicas é permitida indiscriminadamente e pelo que se sabe, não são exigidos documentos de identidade constatando a real idade da pessoa. Ou seja, quem faz as regras são aqueles que protegem os interesses das agremiações que ‘precisam’ faturar para se manter funcionando.
Até o início do mês que está quase iniciando, deverão ser ouvidas as últimas pessoas para que o inquérito seja concluído, o que deve acontecer possivelmente até o dia 10 de março, até lá, seguem presos dois sócios da boate, Mauro Hoffmann e Elissandro Spohr, o Kiko, além do vocalista da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos, e o produtor do grupo, Luciano Augusto Bonilha Leão, que devem ter a prisão relaxada nos próximos dias, pois o prazo 30 dias temporiamente.
Durante todo o dia estão previstas diversas manifestações com muito barulho em homenagem às 239 vítimas do incêndio em Santa Maria. Missas, caminhadas e até manifestações já começaram desde cedo e prometem entrar noite a dentro, mais no desejo de que seja feita justiça e também para amparar todas as famílias que de alguma forma, perderam um ente querido.
O Ponto Inicial se solidariza com todos, mantém a esperança de que tudo seja esclarecido e concluído de forma eficaz. Não voltarão aquelas pessoas para o convívio da gente, mas ficarão para sempre guardadas na lembrança dos nossos leitores. (Foto Ponto Inicial).

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