Apenas sete negras representam um universo de milhares


Por Laudir Dutra
CAXIAS DO SUL - Tainá Oliveira Teixeira, de 17 anos, representante da União das Associações de Bairro – UAB – é a Mais Bela Negra de Caxias do Sul 2012. A escolha aconteceu no dia 08/12 na Casa das Oficinas no Largo da Estação Férrea.
Ingrid Laisa Moraes, de 19 anos, representante da Farmácia Panvel e Giordânia Silva de Cândido, 15 anos, representante do Loteamento Vitória são as princesas.
O concurso é promovido pela Prefeitura de Caxias do Sul, por meio da Secretaria de Segurança Pública e Proteção Social – Coordenadoria de Igualdade Racial e Coordenadoria da Mulher, em parceria com o Departamento de Arte e Cultura Popular (SMC). Tainá substitui Janaína Paim Martins, a Mais Bela Negra 2011.
Novo rumo
O concurso novamente revela um dado preocupante com relação aos negros de Caxias do Sul, pois desde a sua criação, a participação é pífia das meninas negras, mais em função da falta de valorização e atenção dada ao evento.

Por ser um concurso diferente de todos os que são realizados na região e também no Brasil, alguns aspectos devem ser ressaltados, podendo servir de base para futuras escolhas e o primeiro deles diz respeito ao regulamento.
Não dá para padronizar todos os concursos tomando por base o que já existe. A Festa da Uva ao que parece vem servindo de base para a realização de eventos que nem de longe possuem a mesma característica. É assim, por exemplo, com a escolha da Rainha da Festa do Vinho Novo de Forqueta, Rainha de Galópolis, Festa do Agricultor de Fazenda Souza e agora, de acordo com o novo regulamento, a Mais Bela Negra de Caxias do Sul.
Devemos levar em conta que os apelos, pelo menos dos que fogem às raízes serranas, são distintos. Se estão copiando fazem errado, pois, apesar de ser uma escolha que invariavelmente elege uma descendente italiana, não tem este perfil, pois é aberta a todas as etnias. A Festa da Uva é única e atende outros apelos, não pode servir de base.
Afora esta e a escolha da Mais Bela Negra, as outras citadas realmente são diretamente ligadas ao homem do campo, ao italiano, mas mesmo assim, deveria ter o seu próprio regulamento, diferente de tudo o que já existe.
Tainá foi a vencedora da edição deste ano
Outro ponto importante é a premiação que deve ser colocada na ordem das coisas. Um estímulo maior deve se dado às candidatas do Mais Bela Negra e a de outros concursos. Se comparamos e fazemos exatamente igual ou tentamos copiar, nada mais justo que também estímulos sejam dados como forma de motivação para que cada vez mais meninas procurem se inteirar do concurso e de tudo o que ele cerca.
O Jornal Ponto Inicial a partir desta data se coloca à disposição para fazer parte de um grupo de trabalho visando a escolha de 2013.
Este Periódico quer ser parceiro para ofertar à vencedora principalmente, um prêmio pela participação. Não acreditamos que seja tão oneroso investir aí R$ 1.000,00, R$ 1.500,00 na aquisição de uma televisão, uma bicicleta, um notebook ou um celular por exemplo. O próprio poder público poderia ver isso com bons olhos e realmente valorizar as meninas negras de Caxias, que são muitas.
Divulgação
No regulamento divulgado pelo blog da Coordenadoria, ainda costa que a divulgação do evento se daria através de folders e imprensa local. Mas não houve nenhum tipo de chamamento via imprensa, apenas foi passado release dando conta do evento, com a data, local e posteriormente o nome das sete meninas que iriam participar. Nem no referido blog existe algum tipo de apelo para que as meninas, comunidade e a imprensa participassem da escolha. Ainda hoje, após o evento, nada foi postado com relação ao resultado vencido.
Se for para tomar como exemplo outros eventos de beleza, existem etapas que devem ser vencidas, como os pré-concursos, atividades relativas, movimentar as meninas, fazendo com que as mesmas sintam que de alguma forma, participar é importante, pois vão agregar conhecimentos, passarão suas experiências de vida a outras pessoas e terão contato com a população de modo geral e não apenas com os seus familiares, únicos que literalmente ficarão sabendo.
No mínimo todos os veículos de comunicação devem ser chamados, mesmo que alguns não participem, os organizadores devem enviar convites. O papel da imprensa é divulgar, mesmo que em algumas ocasiões, verdadeiras epopeias são travadas para ter o acesso.
Passou em ‘branco’
Em 2011 Janaína Paim Martins foi eleita a Mais Bela Negra e quase, com exceção do Ponto Inicial, não teve repercussão mais ampla. Não teve agenda, não teve aparições em outros veículos de comunicação e nem foi recebida pelo prefeito, como é de praxe em outros concursos. Isto precisa ser revisto, sob pena de ser extinto e de todos aceitar a ideia de que o negro não tem voz e vez na sociedade. De que adianta a existência da Coordenadoria da Mulher, da Coordenadoria e Promoção da Igualdade Racial se lástimas deste tipo continuam acontecendo na cidade.
A população negra de Caxias do Sul pede que seja encaminhada uma nova era, que seja valorizado, que tenha a cor inserida em todos os segmentos e que o tratamento seja igualitário, no mercado de trabalho, na educação, na arte, na cultura, nos eventos e em qualquer iniciativa que envolva pessoas.
Outro dia a reportagem ouviu sem querer uma conversa que o prefeito José Ivo Sartori manteve com alunos de uma escola da cidade por ocasião de uma visita na prefeitura. Um dos questionamentos das crianças foi quanto ao Monumento ao Imigrante.
Sartori explicava para a garotada e também para este repórter leigo que as pessoas se enganam quando acham que o referido monumento é em homenagem ao Imigrante, quando na verdade ele foi erguido para todos os imigrantes que escolheram esta terra para viver, sejam eles negros, brancos, índios, italianos, alemães, portugueses, poloneses, holandeses e que portanto, com os mesmos direitos e deveres.
Esta grandeza é para poucos realmente legítimos representantes do povo, que abrem mão de vaidades, de achismos e de cores partidárias. Devemos ser todos assim despojados de quaisquer pensamentos unilaterais.
Para entrar para a história não precisa necessariamente adotar posturas antipáticas e escrever o nome com caneta de tinta vermelha de sangue das pessoas, basta abrir o coração e os olhos e ver que todos possuem a capacidade de transformação.
A população negra quer um basta, mesmo que de forma tímida e desorganizada, pede ações efetivas que assegure os seus direitos enquanto cidadãos caxienses. O negro não precisa que lhes digam que ele só sabe sambar, jogar bola e cantar pagode, pois isto está no seu sangue e desde sempre, foi a única chance que ele teve de ser inserido no contexto geral das coisas, mas os tempos são outros.
Não precisariam existir cotas nos vestibulares e, por conseguinte, nas universidades se os direitos e as oportunidades fossem iguais a todos, uma notícia não precisaria ser repercutida à exaustão e estampada na capa dos grandes jornais somente quando o negro sofresse algum tipo de preconceito ou injustiça.
E por fim, piadas racistas ou alguns codinomes como ‘negrinho’, ‘negrão’, ‘crioulo’, ‘preto’ já fazem parte do dia a dia de todos os negros, mas ele enquanto pessoa não pode deixar se diminuir e aceitar nenhum tipo de atitude racista, afinal de contas, ele não escolheu a cor da sua pele, mas pode escolher o que quer para a sua vida.
Em qualquer momento, em qualquer situação, escolher viver decentemente e mostrar a cara, sem ser diferente ou menor do que qualquer um é o melhor caminho. (Foto Andréia Copini).

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